Pensar o Direito é, necessariamente, filosofar sobre o Direito, e, por muito que a alguns custe, pensar o Direito acabará sempre por ser (mesmo que involuntariamente) fazer Filosofia do Direito. Ora tem-se normamlmente no universo dos juristas uma errónea e não muito lisonjeira opinião dessa disciplina, tida por adventícia.
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É que sempre há uma filosofia do Direito. E ela é tanto mais condicionadora de uma vivência jurídica prática quanto menos é apercebida. Porque conhecer as influências é já um passo para reconhecer as limitações, e criticar os dogmas. Ora não saber que filosofia nos comanda é ignorar os nossos fundamentos e as rodas dentadas que nos fazem mover.
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O grande problema da Filosofia do Direito é começar a ser preleccionada no 4º, ou, mais frequentemente ainda, no 5º ano, depois de um curso tecnicista, positivista, de um ambiente "cultural" materialista que solicita apenas os alunos para o prazer e o dinheiro (...)
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Quando já se vê ante a selva da concorrência numa advocacia infestada, saturada, que importa ao finalista de Direito Kelsen ou Rawls, S. Tomás ou Hobbes?
Dêem-lhe o curso, que ele quer lutar pela vida. E a luta é de vida ou de morte. Tanto lhe faz se o professor lhe debita a doutrina ou a história, um autor apenas ou uma centena. Ele estudará o que puder. Protestará o que souber. Ele quer-se é ir embora. Filosofias? Filosofias! Ele reeditará o discurso de Calicles contra Sócrates no Górgias de Platão. Isso de filosofias faz bem até certa idade. Depois, é pueril. Não faz ganhar causas. E ganhar causas é o que vai contando.
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A chave de tudo parece residir essencialmente na cadeira de Introdução ao (estudo do) Direito, a qual, a nosso ver, deve ser a grande porta de todo o Curso, simultaneamente abrindo horizontes filosóficos e técnicos. Ela terá, por isso, que ser suficientemente aliciante e rigorosa para poder cabalmente cumprir a sua tarefa.
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Todo o estudo é difícil. Mente quem o negar. Sucede é que quem tiver gosto em saber, quem encontrar motivo para prosseguir, suportará de bom grado essa dificuldade inelutável.
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Há que compreender-se que o jusfilósofo é o menos jurista dos juristas e o menos filósofo dos filósofos.
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Uma das mais agudas questões do nosso tempo jurídico é a do espaço vital do jurista. Ante as ciências sociais, as diversas ordens normativas, as realidades científicas, as disciplinas hermenêuticas, o Direito e os juristas têm de encontrar um espaço. Um espaço seu. Têm de se encontrar a si próprios.
Esta é a primeira demanda a empreender pela Filosofia do Direito. Ela implica uma indagação ontológica, isto é, conduz a reflectir sobre o que verdadeiramente seja o Direito; e obriga, em sequência, a uma questionação epistemológica - há que saber o lugar do saber "Direito" no âmbito do conhecimento, das "Ciências".
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A segunda demanda prende-se com o conhecimento do Direito. Se a Filosofia do Direito pode e deve esclarecer o que é o Direito e quais as suas relações com os saberes, deverá também problematizar o próprio saber do Direito (e de si própria). Estamos no domínio gnoseológico.
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O mundo contemporâneo está habituado a falar e a ouvir falar de Aristótles como de um filósofo. E o mundo contemporâneo, se enche a boca com a palavra filosofia a propósito e a despropósito, não sabe o que ela seja, e por isso dela não gosta. Se avançarmos um pouco no conhecimento de tal personagem, informar-nos-á o homem pretensamento culto de hoje que se trata de um autor antiquado. Porque antiquado é (erradamente, logo se vê), para a intelectualidade moderna, sinónimo valorador (pejorativo) de atigo. (...) Na verdade, quanto mais a nossa cultura é inculta e imitativa, mais nos julgamos cultivados e originais. Não gostamos de modelos, de exemplos, achamos tolos os que veneram, e aplaudimos os que "desmitificam", isto é, vituperam.
in Pensar o Direito I. Do realismo clássico à análise mítica, Paulo Ferreira da Cunha
(negritos meus)
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LOLOLOLOLOLOLOLOLOLOLOLOLOLOL
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